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Dia de Luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe

marcha das vadias 2015_RJ_midia ninja

“A cada dois dias, uma brasileira (pobre) morre por aborto inseguro, problema ligado à criminalização da interrupção da gravidez e à violação dos direitos da mulher”.

Eu sempre fui contra o aborto, e mais: sempre disse que jamais faria um. Repetia todos as frases prontas e preconceituosas que a maioria das mulheres “pró-vida” repetem à exaustão. 

Sempre namorei; relacionamentos longos, estáveis. Alguns, com caras legais, outros nem tanto e uma vez achei que estava grávida do namorado mais babaca que tive. Os pais dele disseram, na minha cara, que se eu estivesse grávida, mandariam ele pro exterior. Eu fiquei chocada com aquilo, mas, aos 20 anos, era uma bobona e não revidei, não respondi e, felizmente, não estava grávida. Se estivesse, minha mãe disse que me apoiaria, caso eu quisesse abortar. Tenho certeza que era por causa do cara. O namoro terminou no ano seguinte.

Alguns anos depois, namorando o sujeito que viria a ser meu marido, descobri que estava grávida: tomava pílula e ela falhou. Acontece. Estávamos juntos há pouco tempo, não tínhamos nada estruturado e eu nem sabia se queria ter filhos, com ele ou com outra pessoa. 

Naquela época, eu não sabia absolutamente nada sobre feminismo, aborto, nada. Era o auge do blog Mothern e seu Livro de Visitas cheio de informações importantes. E foi ali, naquele ambiente seguro, que contei minha história e fui acolhida o tempo todo.

Mas foi uma colega de trabalho que sussurrou um nome: um médico conhecido pelos abortos seguros, recomendado, inclusive, por outres ginecologistas. 

Marquei consulta, o namorado foi comigo. O médico esclareceu todas as nossas dúvidas e foi enfático: pensem bem e tomem a decisão mais consciente, porque não tem como voltar atrás, em nenhum dos casos. Por fim, fizemos o aborto, numa clínica, de forma segura e orientada. 

O pós aborto, no entanto, foi muito duro, pra mim: tive crises de pânico, fiquei deprimida, me senti um lixo, a pior das mulheres. A tal culpa católica bateu forte. 

Poucas pessoas souberam e dessas poucas, uma ou duas me julgaram por suas próprias réguas: foi quando senti, na pele, que falar sobre aborto ainda era um tabu muito grande. Eu não tinha com quem conversar sobre esse e outros assuntos e me sentia muito sozinha. Felizmente, o feminismo surgiu na minha vida alguns anos depois. Foi então que descobri muitas coisas sobre esse assunto, entre elas, que fui muito privilegiada e sortuda por ter tido acesso a um aborto seguro, com meu namorado ao meu lado e principalmente, por ter tido a chance de escolher não seguir com uma gravidez indesejada.

Defender a descriminalização do aborto é defender que todas as mulheres, sem exceção, tenham o direito a autonomia sobre nossos corpos, nossas vidas, nossos planos e sonhos. Uma gravidez acontece a dois. Evitar, prevenir, planejar, é responsabilidade do homem e da mulher. Mas não é o que acontece no Brasil. Aborto é caso de saúde pública, já que o número de mulheres que morrem em decorrência de procedimentos mal feitos é muito alta. 

Não vou me alongar mais. Pra quem quiser saber mais, deixo o link que me motivou a escrever esse relato: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2013-09-20/clandestinas-retratos-do-brasil-de-1-milhao-de-abortos-clandestinos-por-ano.html

 

Por todas nós. Pela autonomia dos nossos corpos. Pela vida das mulheres. 

foto: Midia Ninja – CC-BY-SA

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Aborto, de novo e sempre, legal para todas

A primeira coisa que me aconteceu hoje foi encontrar a matéria da TPM sobre professoras que foram desligadas de universidades por defenderem a legalização do aborto. [Você pode conferir clicando no link: http://revistatrip.uol.com.br/tpm/professoras-defendem-a-descriminalizacao-do-aborto-e-sao-desligadas-de-universidades]

Eu parei de escrever pela legalização do aborto há muito tempo porque, depois de um post contra o Estatuto do Nascituro no finado blog 300 – que nunca parou de receber comentários pra lá de esdrúxulos – eu traumatizei.

No Brasil, além das questões estruturais e próprias da política neste momento específico, há uma cegueira e um silêncio eterno a respeito não só de nós, mulheres, mas também sobre as nossas questões.

Em recentes audiências públicas sobre o assunto, tive o desprazer de ver mulheres falando tanta babosa que a gente poderia fazer uma fábrica de hidratante sem medo.

O raciocínio é simples:

Todo indivíduo é igual perante a lei.

O Estado é laico – portanto não é sujeito a leis religiosas e a fé é livre.

A saúde pública é direito de todos e dever do Estado.

É também dever do Estado tratar e cuidar de todos os seus cidadãos de forma igual.

Isso é Constituição, certo? Vale para todo mundo? Não.

Então porque as mulheres não podem fazer laqueadura a qualquer momento de sua vida? (Não, não podemos, os médicos não fazem, se recusam mesmo que a pobre implore ou peça de joelhos, mesmo que cumpra a regra: maior de 25 anos OU dois fihos).

Por que diabos somos vítimas de violência obstétrica o tempo todo?

Por que somos obrigadas a ter filhos?

O Brasil tem uma montanha de leis que se sobrepõem à Constituição – que garante igualdade de direitos – e impedem as mulheres de dizerem o que querem para si e como querem. Vai daí que mesmo mulheres que legalmente têm direito ao aborto (em caso de estupro, risco à vida ou impossibilidade de sobrevivência do feto já é legal) não conseguem fazer o procedimento na rede pública.

Se você duvida, veja (ou reveja) o sofrimento de Severina.

Existem, hoje, não só projetos de lei que propõem exatamente a legalização. Existem centenas de projetos também que estão à caça dos pouquíssimos direitos que a mulher hoje tem de dizer o que quer ou não em seu corpo. Ninguém é obrigada a seguir grávida. Um punhado de células não pode se sobrepor à vontade de uma mulher adulta – ela, sim, cidadã. Isso é tão mínimo, tão básico, que chega a ser absurdo ainda termos que discutir o assunto.

Mas temos que falar. E as professoras foram demitidas exatamente porque falaram. Porque fazem pesquisas e conversam sobre isso com seus alunos.

Outro dia, num táxi, usei outro raciocínio simples com pessoa religiosa – e parece que funcionou. Porque eu tenho que seguir o que você acha? É muito simples: numa democracia cada um faz o que acha, de acordo com suas crenças. Exatamente por isso é direito da mulher brasileira decidir que não quer ser mãe. Porque ela não quer e ponto. Sem justificativa, sem prestar contas a quem quer que seja. Se a pessoa é religiosa e acha que é errado, que não faça.

A crença é livre – e você pode ser da umbanda, do candomblé ou da corrente evangélica que escolher, ninguém mete a colher, certo?

O corpo é pessoal e intransferível, bem como a vida. O impacto de um filho é algo absolutamente irreversível. Criança exige atenção, cuidado, dedicação absoluta – e não é por um tempo, é pelo resto da vida. As mulheres sabem disso, sabem que, em geral, não contam com companheiros para dividir a carga. Muitas de nós querem sim ter filhos – e estamos aqui prontas para ajudar todas a conquistar seu desejo da melhor forma. E quem não quer?

A criminalização das cidadãs brasileiras que não querem filhos (ou não querem este filho) é um absurdo. Temos o direito de resolver quando, como e se queremos filhos. Não somos chocadeiras (nem objetos).

Com a epidemia de Zika à solta o tema voltou. E ninguém menos que Dráuzio Varella diz tudo o que outros não podem (ou devem, por medo de demissão e outro tipo de retaliação) http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/02/160201_drauzio_aborto_rs

Foto: Unsplash, Mario Azzi

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#PrecisamosFalarsobreAborto

precisamosfalarsobreaborto

A revista TPM convocou a ação nas redes sociais – em tese é pra gente postar foto com a hashtag do título.

Aqui no LuluzinhaCamp a gente sempre lutou pela legalização do aborto. Porque quem morre é a mulher pobre. Porque justo é que todas nós tenhamos pleno direito e controle de nossos corpos. Aborto ser crime é tipo assim dizer que você, menina, moça, mulher, só serve pra ter filho. E não tem plenos poderes sobre o seu corpitcho.

Retrospectiva de posts sobre aborto no LuluzinhaCamp:

Aborto legal para todas nós

Aborto: você não precisa ser a favor para apoiar a legalização

5 Mitos sobre a legalização do Aborto

Pela dignidade da mulher e contra o Estatuto do Nascituro

16 lugares para buscar ajuda contra a violência

    

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Aborto legal pra todas nós

Luluzinhas na Marcha das Vadias 2013
Ontem foi Dia Latino Americano de Luta pela Legalização do Aborto. Infelizmente, a questão virou tabu (de novo) e não há sinais de luz ao fim do caminho – só de trens para atropelar e massacrar ainda mais as mulheres.
Todas nós sabemos que aborto é uma realidade.
Daí que aconteceu um documentário em que as histórias reais ganham voz e vida.

Só lembrem uma coisa, mulheres:

O corpo é seu, a decisão é sua. Ninguém tem direito de dar pitaco ou impor regras.

Ontem teve marcha na Paulista (e você pode checar aqui: http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/09/manifestacao-contra-criminalizacao-do-aborto-ocupa-parte-da-avenida-paulista-9757.html).

Claudia Regina também tá na roda: Eu fiz um aborto
Vocês entendem a clandestinidade de todas nós aqui: 28 dias de luta

Lola também escreveu (sua linda) http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2014/09/dois-depoimentos-do-pais-que-proibe-o.html

No blogueiras feministas, um relato de partir o coração: http://blogueirasfeministas.com/2014/09/minha-mae-morreu-de-aborto-eu-tinha-3-anos-e-ela-21/

E o orgulho do dia (único possível): Somos todas clandestinas.

Documentário sobre aborto no Brasil.
Mulheres contam sua experiência interrompendo uma gravidez. Atrizes interpretam relatos reais.
Direção: Fadhia Salomão
Roteiro: Renata Corrêa
Produção: Babi Lopes
Apoio: SOF e IWHC

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Julgamento Especial no STF: anencefalia

Hoje, acontecerá no Supremo Tribunal Federal (STF), um julgamento importante para as brasileiras. Será colocada em pauta a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 (ADPF 54), que discute a possibilidade das gestantes decidirem livremente se desejam, ou não, interromper a gravidez quando houver o diagnóstico de anencefalia.

A Rádio Justiça transmitirá o julgamento a partir das 09:00 horas.

Já escrevi dois textos sobre o assunto:

O julgamento interrompido: aborto e anencefalia. Nesse texto explico alguns detalhes da ação e traço uma linha do tempo do caso desde que chegou ao STF, em 2004.

Desde 1989, pedidos de interrupção da gravidez em casos de anencefalia chegam ao judiciário brasileiro. A maioria dos juízes concedeu as mulheres esse direito, mas decisões em sentido inverso desequilibravam a jurisprudência. Além dos obstáculos para conseguir realizar o procedimento nos hospitais, mesmo com a autorização judicial em mãos. Aborto no Brasil é crime e muitos médicos tem medo de realizar o procedimento. Portanto, recorre-se ao STF para colocar um ponto final nesse caso da anencefalia.

Vale sempre lembrar que nenhuma mulher será obrigada a interromper uma gravidez com feto anencéfalo. Se a decisão do STF for favorável, todas as mulheres que se encontrarem nesse difícil momento da vida, poderão escolher levar a gravidez adiante ou não. Sem precisar de uma autorização judicial para isso.

Foto de Helio Mota, no Flickr em CC, alguns direitos reservados.

O STF e a antecipação do parto de anencéfalo. Nesse texto explico algumas questões médicas e jurídicas controversas que permeiam os casos de anencefalia, como a definição de morte cerebral, transplante de órgãos e o direito a sucessão.

Tanto o advogado da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que provocou o STF; quanto o voto do relator ministro Marco Aurélio Mello, consideram que nos casos de anencefalia não há uma situação de aborto, mas de antecipação terapêutica do parto. Porque se está comprovada a morte cerebral, não há atentado contra a vida.

É importante lembrar que as mulheres que se veem nessa situação, com uma gravidez de feto anencéfalo, em sua grande maioria desejaram muito ter esse filho. Porém, o diagnóstico por meio de uma ultrasonografia, realizada nos primeiros meses de gestação, acaba sendo um atestado de óbito.

Haverá mulheres que levarão a gravidez adiante e farão do nascimento de seu bebê um evento especial, mesmo que a etapa final seja o cemitério. Porém, há mulheres que não suportam esse sofrimento, que serão torturadas por meses numa gravidez que pode gerar riscos a sua saúde. Todas as mulheres merecem respeito por suas escolhas.

A Gabi Bianco citou uma história muito especial no texto Severina tem que ser feliz de novo. E deixou bem claro um pensamento que também é meu:

Espero que ninguém mais precise passar pelo que passou Severina, que quis comprar uma roupa com touquinha para poder enterrar seu filho, para que na morte ele tivesse pelo menos uma parcela de dignidade. Também espero que as mulheres que queriam levar a gravidez de um feto anencéfalo até o fim sejam respeitadas em sua decisão. Mas a possibilidade de decisão deve existir – e deve ser sempre, sempre da mãe. Nunca de um juiz ou da igreja ou da pressão social. É a mulher que carrega o feto em seu ventre que deve escolher.

Conheça a história de Severina no documentário: Uma Vida Severina.

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